(197) Sentindo a beleza que existe dentro de nós.

Relendo “O Médico Quântico”, do doutor Amit Goswami, lançado no Brasil pela Editora Cultrix, novamente detive a atenção para esta sua explicação:

– Nada no mundo físico tem um significado inerente: nada que vemos, ouvimos, tocamos, saboreamos ou cheiramos tem significado inerente. (…) Além do mundo físico, há também o mundo vital do sentimento. Os sentimentos – o movimento de energia vital – vêm com significado inerente? Não. O que dá significado aos nossos sentimentos? A mente. Apenas a mente nos capacita a processar significado. Essa é a tarefa da mente. (…) O modo como interagimos com o mundo físico e vital que nos rodeia, e como o interpretamos, depende do significado mental que atribuímos aos estímulos com que interagimos.

O que me inspirou esta mensagem foi o filme “Extraordinário”. Trata-se de uma adaptação do livro da escritora americana R. J. Palacio (com o mesmo título), lançado no Brasil pela Editora Intrínseca. Conta a história do garoto August Auggie, de 10 anos, que nasceu com uma deformação facial de causa genética. Em síntese, mostra as dificuldades por ele enfrentadas e transmite uma emocionante mensagem humanista de lição de vida, de difíceis necessidades de interação social e de aceitação do ser humano como ele é, e não pela sua aparência.

Aproveitando a explicação do doutor Amit Goswami, pergunto:

– QUAL É O SIGNIFICADO SUBJETIVO DO “BELO” E DO “FEIO”, EM NOSSAS VIDAS?

– COMO SE PROCESSA A PERCEPÇÃO SENSÓRIA DESSES SENTIMENTOS?

Neste espaço virtual já tive oportunidade de reproduzir parte da introdução da minha abordagem sobre “A Idealização Emocional da Arte” (mensagem 014), sustentando o seguinte:

– No desenvolvimento criativo, idealização é a fase de projeção seletiva de estados de sensibilidade que estimulam a exteriorização artística. A natureza da faculdade da idealização é emocional. No artista, suas “preferências interiores” serão moldadas para o exterior através da variação da sensibilidade de cada um. As manifestações de arte são resultantes de uma qualidade natural latente do ser humano, que será estimulada pela imaginação para, depois, ser aprimorada através da utilização de técnicas específicas que também definem o estilo do artista. A idealização emocional da arte decorre de uma fonte de inspiração objetiva (os elementos do mundo físico, vivenciados pelo artista) e pela dos estímulos subjetivos de uma inspiração inteiramente dissociada da realidade exterior (como acontece na pintura abstrata, em que as cores e formas possuem valores intrínsecos nos domínios da irrealidade).

Certo é que tanto na “idealização” como na “percepção” das manifestações de arte, o ser humano exterioriza as matizes sensórias das suas “preferências estéticas”. Por sua vez, nas diversas possibilidades de “interpretações” (sejam no sentido de “contemplar” ou de “representar”), será mostrada uma consciente variação e modelação do “sentir interior” na forma de expressar a prevalência ou não da nossa subjetiva “concepção” e “percepção” entre as sensações que recebemos do “belo” e do “feio”.

Gostei muito da análise do livro de Palacio, feita pelo médico e psicoterapeuta junguiano Carlos São Paulo, na sua coluna “Divã Literário”, publicada na edição 143 da Revista PSIQUE, lançada no Brasil pela Editora Escala. Por limitação de espaço, reproduzo o seguinte:

– A ESSÊNCIA não está na BELEZA. A experiência com o diferente pode acionar mecanismos de fuga e rejeição que vão além da consciência e nos levam a viver a ilusão de um mundo dividido em perfeição e imperfeição.

– Na Psicologia de C. G. Jung, cada sujeito precisa se relacionar com o mundo externo e objetivo se adaptando a ele; mas também existe um mundo interno e subjetivo, repleto de experiências do ser humano e de nossas próprias vivências guardadas, com diversas tonalidades afetivas, que também exigem que possamos nos relacionar e nos adaptar a ele. Nesse modelo de Psicologia, a estrutura da relação com o mundo externo foi chamada de “Persona”, que é um modo de imaginarmos como somos vistos pelos outros.

– A imaginação de Auggie, sobre nos conhecer com máscaras e depois nos sentirmos em contato com a verdade, evitaria o preconceito, para permitir que pudéssemos ser conhecidos em nossa essência [explico: Auggie fez um acordo com a sua mãe. Aceitou ir para a escola se, desejando, pudesse desistir. Mas o seu desejo era que todos os dias fossem Halloween, pois poderiam ficar mascarados o tempo todo, para as pessoas serem conhecidas antes de saber como elas são sem máscaras].

Em seguida, esclarece o doutor Carlos:

– Nem sempre tomamos consciência da existência da máscara que usamos e de como nos importamos com ela. Na Psicologia de Jung, a estrutura da relação para com o mundo mais profundo de nossa natureza, o mundo interior, foi chamada de “Alma”. E são esses conteúdos existentes na “Alma” que, ao se manifestarem, sofrem a ação da consciência, separando-os em opostos irreconciliáveis.
No mundo da “Alma”, tudo está unido. É nele que nossos ancestrais sentiram que Deus criou os céus, a Terra e contemplou o universo como o todo belo. Também faz parte desse todo Lúcifer, o demônio, uma obra de sua criação. Na “Alma” não há separação entre o perfeito e o imperfeito, existe o ser. É ao passar pela consciência que esse ser pode se transformar no belo, com as suas formas harmônicas e proporcionais, ou em sua oposição, a feiura.

– Na Mitologia Grega, Hefesto, o deus rejeitado por sua feiura, torna-se o artesão que constrói as mais belas obras do Olimpo. Notamos aqui a feiura como estímulo intelectual e pulsão artística para criar o belo. Hefesto casa-se com Afrodite, deusa da Beleza. Podemos perceber aqui o sentido de “casar-se” como uma relação entre o feio e o belo para tornarem-se um. Portanto, o sentimento da “Persona”, em ser visto como o feio, ao casar-se com a “Alma”, que sente em si a beleza interior, faz-nos conseguir um todo em equilíbrio.

– O menino August Auggie, diante dos colegas que o isolam, convive com um conceito de si mesmo, o de alguém que assombra os outros. Com o amor manifestado por sua família, nutre seu valor interior e aos poucos é notado por sua capacidade carismática, até adquirir uma nova percepção do outro sobre si e conseguir fazer os amigos enxergarem um outro tipo de beleza. É o casamento da beleza do fazer com a beleza do ser.

– Auggie são todas as pessoas que ficam mergulhadas na escuridão de um eu que imagina sua imagem mostrada ao mundo em colisão com o ideal de uma sociedade. O sentimento de assombrar o outro, ser motivo de risos, acontece até essas pessoas encontrarem a capacidade de amar a si mesmas, para ser possível serem vistas em sua essência.

Termino esta mensagem, com este pedido: Se você conhece alguém que precisa aprender a “espelhar” a sua beleza interior, sugira a leitura desta e da mensagem 181 sobre a nossa “autoimagem” porque “quem experimenta a beleza está em comunhão com o sagrado” (Rubem Alves).

Notas:

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3.Video do youtube (“Trailer do Filme “Extraordinário” (Dublado)”).

Muita paz e harmonia espiritual.

Publicado por

Edson Rocha Bomfim

Sou advogado, natural do Rio de Janeiro e moro em Brasília. Idade: Não conto os anos. Tenho vida. Gosto de Arte, Psicologia, Filosofia, Neurociência, Sociologia, Sincronicidade e Espiritualidade. Autores preferidos: Carlos Drummond de Andrade, Fernando Pessoa, Mark Nepo, Cora Coralina, Clarice Lispector, Lya Luft, Mia Couto, Mario Sergio Cortella e Mauro Maldonato. edsonbsb@uol.com.br

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