(506) Sentindo o exemplo de Pedro Bloch sentir a vida.

“Em nossas convivências, sejam de que natureza forem, também revelam para nós significados subjetivos das nossas interações existenciais, permitindo-nos reciprocamente conhecer e avaliar todos nós.

São minhas palavras que vieram à mente logo após a leitura da entrevista com o médico, poeta e dramaturgo, Pedro Bloch (1914-2004), feita por Clarice Lispector em maio do ano 1969. Nela ele declarou este seu “sentir” – “Gosto até de quem não gosta de mim”. Um exemplo de ser humano que me proporcionou uma inesquecível admiração pessoal. Para este nosso encontro, selecionei apenas estas partes:

Clarice: Você é um grande médico, teatrólogo famoso: falta-lhe alguma coisa para sentir o homem completo que na verdade você é?
Pedro Bloch: “Não sei se sou grande médico. Sou teatrólogo famoso porque a estatística o afirma. Mas não sendo grande em nada, ajo como se fosse. Quando atendo a um paciente, procuro ser o melhor que posso. Quando escrevo uma peça, acredito que estou fazendo a coisa mais importante do mundo. Completo, não. Completo lembra realizado. Realizado é acabado. Acabado é o que não se renova a cada instante da vida e do mundo. Eu vivo me completando nos outros, mas falta um bocado.”

Clarice: Pedro, você me parece expansivo, espontâneo. E, no entanto, é um homem também reservado, voltado para dentro de si, no sentido em que você dá aos outros e pouco pede para si. Como é de verdade?
Pedro Bloch: Fiz, uma vez, uma receita de viver que acho que me revela. Viver é expandir, é iluminar. Viver é derrubar barreiras entre os homens e o mundo. Compreender. Saber que, muitas vezes, nossa jaula somos nós mesmos, que vivemos polindo as grades em vez de libertar-nos. Procuro descobrir nos outros sua dimensão universal e única. Não podemos viver permanentemente grandes momentos, mas podemos cultivar sua expectativa. A gente só é o que faz aos outros. Somos consequência dessa ação. Talvez a coisa mais importante da vida seja não vencer na vida. Não se realizar. O homem deve viver se realizando. O realizado botou ponto final. Tenho um profundo respeito humano. Um enorme respeito à vida. Acredito nos homens. Até nos vigaristas. Procuro desenvolver um sentido de identificação com o resto da humanidade. Não nado em piscina se tenho mar. Gosto de gostar. Todo mundo é perfeito até prova em contrário. Gosto de fazer. Não fazer me deixa extenuado. Acredito mais na verdade que na bondade. Acho que a verdade é a quintessência da bondade, a bondade a longo prazo. Tenho defeitos, mas procuro esquecê-los a meu modo. “Saber olvidar lo malo também también es tener memoria” [Frase do poema épico argentino Martin Fierro, de José Hernández, do século XIX].

Pensem nisso.

Notas:
1. A reprodução parcial ou total de qualquer parte desta mensagem, dependem de prévia autorização (Lei nº 9.610/98).
2. Havendo nesta mensagem qualquer alegação ou citação que mereça ser melhor avaliada ou que seja contrária aos interesses dos seus autores, mande sua solicitação para edsonbsb@uol.com.br
3. As partes da entrevista com Pedro Bloch foram reproduzidas do livro “Clarice Lispector – entrevista grandes personalidades”, com organização e notas de Claire Williams e tradução da introdução feita por Clóvis Marques, publicação da Editora Rocco, que recomendo para todos como leitura leitura obrigatória.

Muita paz e harmonia espiritual para todos.

Publicado por

Edson Rocha Bomfim

Sou advogado, natural do Rio de Janeiro e moro em Brasília. Idade: Não conto os anos. Tenho vida. Gosto de Arte, Psicologia, Filosofia, Neurociência, Sociologia, Sincronicidade e Espiritualidade. Autores preferidos: Carlos Drummond de Andrade, Fernando Pessoa, Mark Nepo, Cora Coralina, Clarice Lispector, Lya Luft, Mia Couto, Mario Sergio Cortella e Mauro Maldonato. edsonbsb@uol.com.br

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