(289) Sentindo a necessidade de criar um sentido simbólico para o tempo do nosso existir, nesta pandemia.

“PARA MIM, O IMPORTANTE EM POESIA É A QUALIDADE DA ETERNIDADE QUE UM POEMA PODERÁ DEIXAR EM QUEM O LÊ SEM A IDEIA DE TEMPO.
São palavras do poeta espanhol Juan Ramón Jiménez (1881-1958), que em 1956 foi merecidamente laureado com o Nobel de Literatura. Nestes momentos difíceis da pandemia, tenho buscado refúgio na sua sensibilidade poética. Ela me fortalece e tem me ajudado acreditar no “despertar” de um novo renascer “pós-pandemia”, com mais união e solidariedades humanistas. Jiménez é um dos meus preferidos poetas estrangeiros, porque temos muitas identidades no nosso modo de sentir o “BELO” e de vivenciar a abstração ilusória da “passagem do tempo” em nossas vidas. Para ele, o que importa nas suas poesias é a eternidade das suas permanências sem condicionamento de temporalidade. Para mim (que também considero ser ilusória a passagem do tempo), eternidade é uma sensação de perpetuação sensitiva de um “para sempre atemporal” dos nossos sucessivos “agora” que novamente podemos vivenciar, assim como são, para nós, as imagens simbólica da linguagem do nosso psiquismo inconsciente.

De acordo com o filósofo francês Henri Bergson (citado pelo Psicólogo Daniel Lascani, no seu artigo “Eixo Mente-Tempo”), o tempo é um fenômeno mental e não espacial. É apenas uma percepção humana, uma construção psicológica. A consciência, através da memória, produz o tempo passado e, também, a noção de tempo futuro. Qualquer lembrança está presente, podendo ser atualizada em nosso cérebro, relativamente, em qualquer momento. O passado é representado por nossas lembranças, memórias, conhecimentos, habilidades, razões; nosso futuro são nossas esperanças, encantamentos, ansiedades, criações e emoções. Já o presente é apenas um constante sentir, através da consciência. Nossa mente cria essa divisão cartesiana entre passado, presente e futuro, que denominamos de tempo.

Complementa o doutor Daniel Lascani, pós-graduado em Psicologia Junguiana pela PUC-Rio:

– A psique humana consegue, claramente, observar que o presente está sempre passando, que o passado está sempre presente, se acumulando, e que o futuro é um tempo presente que está sempre chegando, em cada instante no contínuo espaço-tempo. Tudo é um constante tempo presente. Temos percepções produzidas, relativamente, pela nossa memória. Para uns, um dia pode passar rápido, para outros, nem tanto, dependendo do eixo mente-tempo que também se relativiza, inconscientemente, em cada um.

Gosto desta explicação do médico e psicoterapeuta junguiano, Carlos São Paulo:

– Somos a ponte entre a percepção do mundo em nosso entorno – o mundo da luz – e o da percepção inconsciente – o mundo das trevas. Como resultado temos a imagem do mundo em que vivemos, o qual nos orienta na adaptação da nossa realidade. O mundo da luz nos deixa alheios ao que acontece na escuridão da alma, mas é na combinação dessas duas condições que nasce o “espírito do tempo”. O filósofo Hegel difundiu zeitgeist como o “espírito do tempo”. Trata-se da alma de uma época que se expressa no clima intelectual e cultural do mundo. (…) Estamos entre o “espírito do tempo” e o “espírito das profundezas”. Para dialogar com essas condições, precisamos respeitar nossas figuras da imaginação e saber dar sentido simbólico a esses acontecimentos para que o eu consciente possa acolhê-lo. Essa é a tarefa que faz o homem perceber seu ritmo interior e seguir o seu caminho único. Marchar com o seu ritmo pessoal, resistindo bravamente ao barulho infernal dos tambores que rufam lá fora. Esse é o desafio para evoluir.

Pergunto:

NO PÓS-PANDEMIA, QUAL SERÁ O “SENTIDO SIMBÓLICO” DO SEU ATUAL EXISTIR?

O meu está sendo construído com a mesma esperança do timoneiro que, navegando pelas águas agitadas desta pandemia, acredita na chegada da sua embarcação em um porto seguro em águas tranquilas dos novos mares das nossas vidas. Será quando, livres do covid-19 nunca vamos esquecer deste “sentir” de Juan Ramón Jiménez.

“MARES”
Sinto que o meu barco
encontrou algo grande
lá no fundo.
E nada acontece!
Nada…
Silêncio… Ondas…
Nada acontece?
Ou tudo aconteceu
e estamos tranquilos no novo…

Notas:
1.A reprodução parcial ou total, através de qualquer forma, meio ou processo eletrônico, dependerá de prévia e expressa autorização do autor deste espaço virtual, com indicação dos créditos e link, para os efeitos da Lei 9610/98, que regulamenta os direitos de autor e conexos.
2.As citações dos artigos do psicólogo Daniel Lascani e do doutor Carlos São Paulo foram reproduzidas, respectivamente, das edições ns. 143 e 129 da Revista PSIQUE, lançada no Brasil pela Editora Escala.
3.Havendo, neste espaço virtual, qualquer citação ou reprodução de vídeos que sejam contrários à vontade dos seus autores, serão imediatamente retiradas após o recebimento de solicitação feita em “comentários” no final de cada postagem, ou para edsonbsb@uol.com.br

Muita paz e harmonia espiritual.

Sobre Edson Rocha Bomfim

Sou advogado, natural do Rio de Janeiro e moro em Brasília. Idade: Não conto os anos. Tenho vida. Gosto de Arte, Psicologia, Filosofia, Neurociência, Sociologia, Sincronicidade e Espiritualidade. Autores preferidos: Carlos Drummond de Andrade, Fernando Pessoa, Mark Nepo, Cora Coralina, Clarice Lispector, Lya Luft, Mia Couto, Mario Sergio Cortella e Mauro Maldonato. edsonbsb@uol.com.br
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